sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Confusão entre sujeito e objecto - Rosmini

[A] natureza dupla (por assim dizer) do sujeito humano, por essência inteligente e consequentemente por essência na posse de um objecto universal do seu entendimento, tem sido muitas vezes negligenciada. Este engano, que confunde o objecto essencial para o sujeito inteligente com o próprio sujeito, causou vários erros. Aquilo que pertence apenas ao objecto é atribuído ao sujeito, e vice-versa aquilo que pertence ao objecto é atribuído ao sujeito. Esta incorrecção deu origem a dois sistemas éticos erróneos, aos quais, me parece, todos os erros do ensinamento moral podem ser, em última análise, reduzidos.

O primeiro sistema erróneo atribui ao sujeito aquilo que pertence ao objecto. Já indiquei como o objecto (que, no meu entendimento, é a lei moral suprema) está dotado de características divinas, como sejam a imutabilidade, a eternidade, a universalidade, a necessidade. Todas estas características foram erradamente atribuídas ao sujeito humano, que desse modo foi deificado. Aqueles que defendem este sistema falam entusiasticamente do que é divino no ser humano, e fazem a criatura humana uma lei por si mesma. Kant chamou a este sistema de autonomia, isto é, "lei de si mesmo".

O segundo sistema erróneo cai no outro extremo, atribuindo ao objecto, isto é, à lei moral, aquilo que pertence ao sujeito. O ser humano é mutável, temporal, limitado, contingente, e são feitos todos os esforços para atribuir estas características à lei moral. Aqueles que defendem este sistema querem fazer crer que a lei está sujeita a mudanças contínuas, tal como o clima, os costumes, a educação ou as raças mudam. Tal sistema destrói toda a lei moral, e tem sido convictamente ensinado e difundido juntamente com a filosofia sensista que lhe deu origem.